Hoje é o ser humano que morre: o homem e a mulher, a criança e o idoso, o pobre e o rico, os santos e os pecadores. Hoje são os animais que morrem: a borboleta, a tartaruga, o pinguim, a minhoca, o tubarão, a águia. Hoje são os vegetais que morrem: o cedro, a samambaia, as orquídeas, as sequoias, a cebolinha, o pé de laranja-lima, o capim.
Amanhã, os mortos serão outros. Quando vier o que é perfeito, quando vier o que é completo, quando vier o Rei da Glória, “deixará de existir o incompleto” (1Co 13.10). Então haverá muitas mortes e muitas marchas fúnebres, uma mais esplendorosa do que a outra.
O enterro do pecado:
O pecado entrou no mundo pela desobediência de um só homem. O pecado provocou a queda, que é palavra-chave para entender a teologia, a antropologia, a sociologia, a psicologia. Ele é o intruso que penetrou em todas as esferas da vida e trouxe todo o mal que existe. Porém Jesus é “o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo 1.29). O pecado está moribundo e vai acabar de morrer. E nós vamos participar da marcha fúnebre do pecado!
O enterro da morte
A morte é a amante do pecado. Ela entrou no mundo agarrada ao pecado. E o vínculo do pecado com a morte afetou a humanidade inteira. A morte tem sido campeã invicta, entra sem cerimônia pela janela do casebre do pobre e pela janela do palácio do rico, e arranca da cama quem ela quer e quantos ela quer. Contudo, Jesus venceu a morte, destronou-a e deu um sumiço nela (1Co 15.25-26). A morte está moribunda e vai acabar de morrer. E nós vamos participar da marcha fúnebre da morte!
PS.-Todos morrem. É o fim da existência humana, o cessar da todas as faculdades físicas e intelectuais e o começo do dialogo com Deus que liberta de suas limitações psicológicas e materiais.Quando nós homens tivermos aptos para prolongar a longevidade ou até mesmo adiar a morte para mil anos como era antes de Noé, através de hibernação, nem assim a religião estaria confusa, a vida temporal terá um fim; o corpo não existirá eternamente.
O enterro do sofrimento
O sofrimento humano começou no jardim do Éden. Teve o seu início logo depois da queda. O sentimento de culpa, o remorso e o medo, as primeiras manifestações do sofrimento, aconteceram naquele lugar e naquela ocasião. Ainda naqueles primórdios deram-se a primeira violência, a primeira brutalidade, o primeiro crime. Adão e Eva eram pais tanto da primeira pessoa assassinada como do primeiro assassino. Mas está escrito que não haverá mais tristeza, nem choro nem dor (Ap 21.4). O sofrimento e seus acompanhantes estão moribundos e vão acabar de morrer. E nós vamos participar da marcha fúnebre da dor, da lágrima, dos gemidos e da tristeza!
O enterro das más lembranças
A memória registra implacavelmente lembranças agradáveis e lembranças odiosas. Não existe um filtro para separar umas das outras. As lembranças negativas fazem sofrer, inquietam, perturbam o equilíbrio emocional, adoecem gravemente, provocam desespero, desencanto pela vida e vontade de morrer. Deus sabe disso e procura ajudar, abrindo as portas da confissão de pecado e do absoluto perdão. Porém, só quando vier o que é completo é que essas lembranças dolorosas vão acabar de morrer. E nós vamos participar da marcha fúnebre da memória doentia!
O enterro das incógnitas
Paulo tinha certeza do fim das incógnitas: “Tudo quanto sei agora é obscuro e confuso, mas depois conhecerei perfeitamente, assim como [hoje] sou conhecido” (1Co 13.12b). A revelação, agora gradativa, chegará a seu ápice e explicará todas as coisas ainda inexplicáveis, tanto na área filosófico-teológica como na área pessoal. A perda de todos os seus bens, de todos os seus filhos, de toda a sua glória, uma coisa atrás da outra, deixou Jó e seus amigos profundamente intrigados. O que sustentou o homem da terra de Uz foi a sua tríplice certeza: “Eu sei que o meu Redentor vive”, “[Eu sei que] no fim ele virá me defender” e “Eu sei que depois que a minha carne for consumida, sem ela estarei na presença de Deus” (Jó 19.25-26). O que Jesus disse ontem a Pedro, a mesma coisa diz aos cristãos de hoje: “Você não entende agora por que eu estou fazendo isso; mais tarde, porém, entenderá” (Jo 13.7). As incógnitas desaparecerão. E nós vamos participar da marcha fúnebre delas!
O enterro das crises
Não se pode escapar hoje de alguma eventual crise no curso da vida. As crises de José, quando foi vendido pelos próprios irmãos, quando foi caluniado pela mulher de Potifar, quando foi esquecido pelo copeiro de Faraó. A longa crise de Davi, depois do adultério, depois do assassinato de Urias, depois da morte da criancinha, depois do estupro de Tamar, depois do crime de Absalão. A complicada crise de Asafe quando ele percebeu que os maus “não sofrem como os outros sofrem” (Sl 73.5). A crise de Pedro em seguida à tríplice negação. As crises são verdadeiros parêntesis de duração às vezes demorada, das quais não se sai de uma hora para outra. Mas elas também estão no leito da morte porque “Deus é amor” (1Jo 4.8). E nós vamos participar da marcha fúnebre das crises!
O enterro da imperfeição moral
Desde a antiga aliança até a nova, o absolutamente santo diz aos absolutamente pecadores: “Sejam santos porque eu sou santo” (Lv 11.44-45; 1Pe 1.15). No Sermão do Monte, Jesus insiste: “Vocês devem ser perfeitos, como o seu Pai celestial é perfeito” (Mt 5.48). O paradigma é bonito demais: “[...] cresçamos a ponto de que Cristo ocupe completamente todo o nosso ser” (Ef 4.13). Porém, ao mesmo tempo, distante e difícil demais, a ponto de ser praticamente impossível, neste corpo e neste tempo, por causa do terrível drama do pecado residual (“o pecado habita em mim”) e do pecado estrutural (“o mundo todo está sob o poder do maligno”). Mas essa imperfeição moral está à morte, porque “à medida que o Espírito Santo trabalha dentro de nós, somos transformados com glória cada vez maior, e tornamo-nos mais e mais semelhantes a ele [...]” (2Co 3.18b). “Quando Cristo aparecer, ficaremos parecidos com ele [...]” (1Jo 3.2b). E nós vamos participar da marcha fúnebre de qualquer mancha pecaminosa!
O enterro da poluição ambiental
Além da poluição moral – o mal é o bem, as trevas são a luz, o amargo é doce – e da poluição teológica – o anticristo é o Cristo, o falso profeta é o profeta, o joio é o trigo, a expiação é pela dor e pela caridade –, temos também a poluição ambiental. O ser humano esqueceu-se de que foi feito mordomo da criação e egoisticamente tornou-se dono dela. Em vez de cuidar da terra, ele a explora o quanto pode. Daí a anarquia que desregula a chuva e a estiagem, o calor e o frio, o outono e a primavera, o nível do mar e as geleiras das montanhas. Daí a sujeira das praias, dos lagos e dos rios. Daí a quantidade enorme de destroços de naves espaciais em órbita da terra. Daí os danos causados à camada de ozônio. Daí os tsunâmis que invadem o litoral de todos os continentes. A despoluição do planeta e do espaço que o envolve é impossível. O máximo que se pode conseguir a custos elevadíssimos é a despoluição de uma praia, de um rio, de uma floresta. Mas quando a Bíblia fala de novos céus e nova terra, ela indica a remoção de toda a intromissão do ser humano e das potestades do mal incrustadas no primeiro céu e na primeira terra. A feiura cede lugar para a beleza original, o caos cede lugar para a ordem original, o vestido remendado cede lugar para o vestido novo, como está escrito: “Então vi uma nova terra e um novo céu, porque a primeira terra e o primeiro céu haviam desaparecido” (Ap 21.1). E nós vamos participar da marcha fúnebre da poluição!
O enterro dos demônios
Uma das nossas incógnitas é a origem do pecado em algum lugar do espaço afetando apenas os seres angelicais, antes da experiência adâmica. As chamadas potestades do ar ou os poderes espirituais cósmicos existem e não são, como lembra Richard Foster, “assombrações flutuando no ar e espreitando indivíduos incautos, mas realidades espirituais que desempenham papel definido nas atividades dos seres humanos” (Dinheiro, Sexo e Poder, p. 178). O mesmo autor afirma que “quem viu os crematórios de Dachau e Auschwitz não tem dificuldade para acreditar nas potestades demoníacas” (p. 180). Mas essas poderosas forças malignas já foram potencialmente derrotadas na morte e na ressurreição de Jesus. São forças vencidas, mas ainda insepultas. Mas quando chegar o que é completo, o diabo, a besta e o falso profeta serão lançados no “lago de fogo” e “serão atormentados dia e noite para todo o sempre” (Ap 20.10). E nós vamos participar da marcha fúnebre de todas as potestades do ar!
Comentários
Postar um comentário